Enfrentando o tempo e a morte
Artigo capa da revista Meer de hoje;
https://www.meer.com/pt/76209-reflexoes-sobre-a-finitude
“Quando eu era criança, minha mãe sempre me dizia que, nesta vida, a única certeza que possuíamos era de que os humanos tinham solução para tudo, exceto para a morte.”
Pois…
A finitude sempre foi certa, verdade absoluta! Embora saibamos que ela nunca foi aceita por todos e em nome deste temor ou pavor, nós criamos mitos e religiões.
Saber que não teremos mais utilidade, que possuímos uma doença mortal ou que as relações acabam sempre foi difícil para a nossa mente humana, na verdade nós temos dificuldade em aceitar que somos finitos.
Quando estamos de frente para o fim, clamamos por mais chances, mais oportunidades, nós clamamos pela Vida (Deus). Nós aprendemos na escola que que nascemos, crescemos, reproduzimos ou não, envelhecemos e morremos, não é mesmo?
Então, por que tememos a morte, sendo que ela é a única certeza que temos? Por que tentamos fugir desse encontro inevitável?
O Budha chamava isso de Samsara ou Sangsara (roda do sofrimento).
“As dores são inevitáveis, mas o sofrimento é opcional.”
(Budha)
Ora, ora minha gente, o entristecer faz parte, isso faz parte de ser humano, se sentir triste, ficar aborrecido, chateado e pensativo, e isto é diferente de não aceitar.
O luto pode e deve ser sentido. Ninguém precisa ficar feliz ou menos triste porque não pode mais se lambuzar de doces e é proibido de tomar uma cervejinha, correto?
Nós sabemos como gira a roda do Samsara, compreendemos que tudo o que começa, termina e que tudo que nasce, morre. O que traz algum conforto é saber que os sentimentos existem, são mutáveis e não nascem, ufa que sorte! (risos).
Ninguém terá as suas dores, por mais que as pessoas sejam solidárias a si, as suas dores são suas. Ninguém morrerá no seu lugar, ainda que alguém diga que deu ou dará a vida por si, esse alguém não terá como morrer no seu lugar.ra
Se a pessoa morrer terá dado fim à vida dela e não à sua.
Portanto, parece-me que o melhor que se pode fazer, é compreender que somos os únicos responsáveis pela própria nossa existência, e só você sabe quem você é! Ser honroso é ser responsável.
“Se ninguém mais pode sentir por mim, se não há quem possa falar as palavras que estão na minha boca, é mais que uma necessidade, um dever, uma questão de honra saber quem sou, para que eu possa dizer ao mundo a que vim. É uma obrigação moral.”
(Carl Jung)
Mas, e se a areia da ampulheta estiver prestes a se esgotar? A finitude sempre foi um dos dilemas mais melindrosos da cultura ocidental. Somos relapsos com o tempo, investimos muito tempo em chateações e ficamos constrangidos de quando estamos contentes. O dia passa e a gente só se dá conta disso quando já entardeceu e a noite chega tão rápido quanto o cansaço.
E, quando retiramos o relógio cronológico do pulso no final do dia, exaustos e loucos por uma boa noite de sono, é quando os relógios psicológicos e biológicos começam a correr, e eles têm uma predileção imensa por correr. Cansados e já sem tempo para reflexões, muitas vezes adormecemos com o pensamento; Mas, e o tempo?
O tempo perdido não pode ser recuperado, e o tempo vendido também não!
Então?
Então, isto e como afirmam os grandes sábios, que o tempo é com certeza o bem mais valioso que possuímos na prateleira, pois, uma vez vendido, perdido, emprestado ou doado, não há como recupera-lo Nunca mais teremos o mesmo tempo, isso não dá volta atrás.
O tempo vai passar para todos, e ele é como o aroma das manhãs de outono aqui nas montanhas, assim que o Sol aparece elas se dispersam, é preciso ter a atenção plena, voltada para si para que suas narinas percebam os aromas da vida.
O que é valorizar o seu tempo, para você?
Geralmente, quando paramos para refletir sobre a finitude da vida, começamos a atribuir a nós mesmos mais obrigações. Começamos a pensar que deveríamos nos aproximar mais de Fulano, dar mais atenção a Ciclano e não responder de forma rude aos Beltranos, não é mesmo?
Entretanto, devemos entender onde nosso mundo desmorona, onde o cinto aperta e qual é a paz que não queremos perder.
Certa feita, numa palestra sobre as questões profundas, dramáticas e necessárias da vida, achei interessante quando o palestrante (meu professor de ética), afirmou que o existencialismo deveria ser mais estudado, porque segundo ele que ao nos conscientizarmos de nossa finitude, nos tornaríamos seres melhores.
Argumentava com muita autoridade que quando tomamos conscienciaque tudo “acabará” a gente muda, Fiquei pensativa… Então a finitude seria um polidor da moral.
“Humm”, será?
Vamos refletir sobre isso!
Ok! Existem muitas pessoas que reagem bem quando percebem que algo está próximo do fim, e devido a isso até se tornam mais meigas, serenas e gentis, por assim dizer.
Porém, entretanto, TODAVIA;
Também sabemos que existem aquelas “persona non gratae” que vão “pôr para arrebentar” e pouco se importarão com o que vai restar, certo?
Sim, é claro que existem muitas pessoas que, ao compreenderem que o tempo está se esgotando, optam por contribuir com o mundo com boas ações, pensarão na própria descendência, afirmo que são pessoas que assimilaram o karma e, por isso, tentam escapar da Samsara.
Mas, do outro lado, temos outras pessoas, aquelas que não assimilaram ou não aceitaram o karma e, por mais que a vida já as tenha ensinado, elas ainda não cederam. Elas não ligam com os frutos que deixarão para a sua descendência. São hostis, rudes, ingratas e autoritárias.
Estas pessoas terão que passar por muitos renascimentos para entenderem que há coisas muito valiosas que felizmente existem coisas que dinheiro não pode comprar.
Portanto,
A finitude não afeta a humanidade de forma igualitária e nem poderia, porque na verdade somos muitas vidas cármicas sendo vivendo e partilhando no Universo ao mesmo tempo.
Penso que é mais sábio colecionar muitos bons momentos do que muitas coisas no tempo, penso que é por isso que o cheiro do amor ainda acalenta e o sexo apenas esquenta, é por isso que a amizade conforta e a gula só engorda, é por isso que os olhares ainda se cruzam e se encantam. É, só por isso!
Relaxa, cada um tem a sua própria compreensão…
Pode ser que ninguém tenha entendido nada, e também pode ser que aqueles que afirmaram ter entendido também não tenham percebido (risos).
Certo é que o mundo é extremamente diverso, e não há nada igual.
Somos singulares e apenas semelhantes, como o grande Aristóteles já disse. Saber como enfrentar a morte é essencial e fundamental, ter liberdade é saber que ela só vem com alguma perda.
Nada é absoluto, nada é eterno, e, portanto, tudo é impermanente.
O que transcende, ou seja, o que passa de uma vida para outra são conceitos, padrões e, ocasionalmente, doenças hereditárias.
Com tudo isso em mente, acho que vale a reflexão de sabermos o que realmente desejamos quando tudo chegar ao fim, não é mesmo?
Por hora, deixemos o sol entrar, fazer morada e brilhar mesmo que seja inverno.
Gratidão,
Dan Dronacharya