Caminhando além das lendas
“A vida é dinâmica e não tem nada de estática, e essa tal de estabilidade das coisas é só mais uma lenda, tudo que existe é impermanente.”
Os movimentos da vida revelaram-nos o quão interessantes são os nossos dias, saber viver é perceber que os nossos sentimentos mudam conforme os momentos vividos e entender que as más energias brotam da falta de reverência ao Divino.
Esses são pontos importantes que deveríamos ter sempre em mente. Isso nos faz uno (Yoga). Portanto, aquela lenda de que o Sol nascerá e brilhará entre os bons e os maus, independentemente do que você queira, parece que tem mesmo as suas razões de existir, pois não?
Eu acredito que durante a nossa passagem por esta vida, teremos dias de Sol intenso em que os nossos corações se sentirão aquecidos e esses transbordarão de alegria, nesses dias de luzes radiantes, creio que somos mais belas do que toda a estação da primavera.
Entretanto, sabemos que nem tudo são flores e também já nos é sabido que haverá aqueles dias menos glamourosos em que poderemos ficar murchas e um pouco ou um tanto sem sal e sem açúcar parecendo doce com adoçante, sabe?
Dias cinzentos, oh, que horror! Dias em que geralmente nos sentimos inferiorizados por tudo e por nada, momentos que as frutas não possuem o mesmo sabor que outrora e tudo é motivo para irreverência e reclamações. São dias cheios de dissabores, aqueles percalços da vida que persistem e insistem em aparecer naqueles momentos de felicidade ou prazer, pequenos instantes em que não queríamos que estes sentimentos surgissem, mas pronto! Quando a gente menos espera, eles aparecem como nuvens que tapam o Sol e, buhhh! Molha a praia, né? Tudo perde a graça, o encanto e a vida escoa como água pelo ralo. Esse sentimento causa-nos um mal-estar tão grande que nos desnorteiam totalmente os sentidos e podem mudar provisoriamente ou até definitivamente a nossa perceção e a nossa forma real de ver o mundo.
Mas, também é verdade que são nestes momentos menos radiantes que nós nos lapidamos e ganhamos força mental e tesão pela vida, dando valor na nossa essência e protegendo-nos ainda mais daquelas “personae non gratae” ou mais popularmente conhecidas como vampiros energéticos.
Portanto, parece-me que a melhor e primeira atitude é repousar a mente nesta salada de sensações, não ter pressa e suportar a pressão, é prudente refletirmos sobre essa necessidade pequena que temos de nos entristecer perante as adversidades da vida, refletir sobre os momentos e sobre o tempo que eles duram é a chave para evitarmos os contratempos.
Geralmente, nós sentimos a nossa energia vital diminuída ou apequenada quando perdemos o contato com a nossa essência, quando isso acontece a vida perde a graça, a cor ou o sabor. Mantenha a mente calma diante desses pormenores e procure entender o vazio e a imensidão do universo. Ouça, apenas ouça o que vem de fora, depois de ouvir valide a informação e reflita! Sinta o teu universo interior com todos o Sois, Luas e Oceanos e analise bem! Veja se vale a pena se aborrecer com a gente ou com outros. Dê uma olhada ao redor e veja se compensa arrefecer os Sois, aquecer as Luas ou transbordar os oceanos por qualquer coisa mundana, veja aí! Acho que não, né? Eu penso que nessas horas é melhor perdemos a pressa e desacelerarmos o passo e fazer como a minha sogra faz e pedir logo um pastelinho de nata e quem quiser levar a sua graça que fique totalmente sem graça (risos).
Ela tem razão em manter a alegria interna independentemente do que passa a seu redor, isso é santosha, uma reverência ao Divino de cada interior. A nossa relação com os nossos erros é tão importante quanto a nossa relação com os nossos acertos e tudo faz parte da salada, isto é a impermanência da vida e a gente pode fazer novas e diferentes escolhas o tempo todo. Não há impeditivos, afinal liberdade é responder pelas escolhas que fazemos, não é mesmo? E aquilo que não depende da gente, também não é da nossa responsabilidade.
Eu tenho lido muito sobre o Karma, sobre a sua filosofia e a influencia disso na nossa vida e acho que se tirarmos todo o misticismo que o nome possa carregar e afastarmos o julgamento do nosso pensamento ocidentalizado, nos será possível entender a lenda criada em torno da palavra Karma que é mundialmente conhecida como consequência ou até predestinação.
Entretanto, na minha opinião as nossas situações karmicas e as obrigações da vida que temos são como as doenças genéticas que possuímos, não há o que se fazer, é algo que vem de outras vidas. Aceitar é o caminho mais suave e menos sofrido, eu garanto! Na realidade quando não nos aceitamos, nós nos perdermos e não sabemos mais quem somos, nos damos demasiado aos outros e passamos de assertivos a confusos, de prudentes a inseguros, enciumados e bajuladores.
Na sua mente cheia de informações de como você deve ser, existirá alguém que você ira considerá-lo como salvador da pátria e você fara tudo para mantê-lo por perto. Você acreditara que ele é capaz de ensinar-te a ser melhor do que sua própria essência. Humm! Me cheira a vampiros, acho que é prudente não nos distanciarmos de nós… Cuidado com isso! (risos). Pois, bem certa vez eu li numa dessas postagens de rede social a seguinte frase:
“Ciúme a gente tem do que é da gente, inveja a gente tem do que é dos outros”.
Essa frase mexeu comigo, bateu fundo! Como bem dizem os portugueses (risos). Acho que na altura eu estava em busca de dar nobreza ao sofrimento, queria explicar o meu aprisionamento e também não queria de forma alguma ser notada como tola. Ou seja, eu queria colocar lógica no sentimento do ciúme.
Yes! Eu queria explicar logicamente o caminho que uma pessoa trilha para chegar a ter ciúmes, eu achava que a pessoa tinha o “direito” de senti-lo. Vê se pode um negócio desse?
E o pior, é que eu até acho que consegui ver a lógica na mente do ciumento (na minha mente ciumenta). Depois de perceber o que nos leva a isso, deixei de sentir o danado. Bom demais!
Esse sentimento que muita gente confunde com falta de confiança no outro e blá, blá, blá, nada mais é do que falta de amor próprio. Só sente ciúmes quem não tem a si e por falta desse preenchimento nos entregamos muito facilmente nas mãos dos outros, nós temos em mente a crença latente de que somos menos e de que teremos que fazer por merecer o amor do príncipe encantado, e para além disso viveremos a disputar com todos e nunca seremos boas o suficiente e no fim da história você poderá ser trocada, é que neste tipo de relação o amor tem data de validade.
Que tolice! Que horror! As relações atuais mais parecem um filme de tortura e infelizmente é percetível que desenvolvemos um medo terrível de perder, mas perder quem ou o quê? O mais importante é você e nessa altura do campeonato, essa pessoa você já deixou para trás.
Calma, respire fundo e perceba a realidade, veja a impermanência das coisas, sinta a sua própria fluidez! Tenha paciência consigo, é lenda! O amor não cabe num papel A4.
Entenda que o ciúme, assim como o sentimento de posse, é fruto de um outro sentimento, o de inferioridade. Por nos sentirmos inferiores nos tornamos inseguros e ciumentos e sempre acharemos que estamos sendo excluídos de alguma coisa ou situação.
O medo de ser trocado, abandonado ou menosprezado é insuportável para a mente daquele que vê tudo como um palco de disputas.
Portanto, é um tanto quanto insano exigir que essa mente carente, insegura e com medo tenha confiança em alguém, não é mesmo?
Acredito que o amor tem as respostas e quando digo amor, eu falo do amor contigo, falo da relação íntima e gostosa com o seu ser. Não acho que isso possa ser de outro. Amor é algo sentido por si em si…
Foi buscando a lógica de se ter ciúmes que eu deixei de o ter, foi na luta para provar que eu era a melhor, a certa ou merecia ser a escolhida que tomei o golpe fatal e descobri que por amor não se luta, mas muito pelo contrário, por amor se entrega, se declara perdedor e se abstém da razão e da guerra.
Bendita seja a colocação do apostolo Paulo dos cristãos, “o amor tudo tolera, tudo suporta, não se enciúma e nem se enerva, não se envaidece e não se engrandece…”
Durante a minha saga eu percebi que o amor é feito água de poço e que essa ideia de se fazer digna de ser amada é só mais uma das muitas lendas que os romancistas do seculo XIX inventaram para escravizar pessoas. Nessa onda a gente se abandona para nos fazermos dignas de sermos as escolhidas e assim perdemos a vida disputando com tudo e com todos. Garanto que não vale a pena!
Hoje, totalmente curada deste sentimento, posso afirmar-vos que as vezes as marcas dessas lutas internas apareceram na pele em formas de eczemas, só pra lembrar-nos de que um dia caímos nos contos.
Todas as ações deixam as suas marcas e lições, uma boa lição é saber que a ilusão não deve fazer parte da vida daqueles já que aceitaram as suas imperfeições. As lagrimas ainda caem, e hoje são lagrimas de arrependimento e não necessariamente dor. O arrepender nos faz crescer e ele pode trazer aí algum desconforto, mas isso está longe de ser dor.
Arrepender do que fizemos connosco nos ensinará a nos perdoar e a não cometer os mesmos erros, nos valorizaremos e nos amaremos intensamente e não vamos querer saber o que os outros fazem e nem vamos ter medo de sermos “trocadas”, ha! Isso é libertador.
Quando estamos trilhando o caminho de volta, nós passamos a aceitar as coisas com mais facilidade, isso não nos deixa isentos ou blindados contra os sentimentos ruins, o que adquirimos com esse processo de retorno é a habilidade de lidar com problemas difíceis.
Com o avanço da caminhada, nos é possível perceber que tudo aquilo que nos enrijece e nos entristece também nos rouba de nós, portanto isso não deve ser aceito com mansidão e nem sem explicação.
O caminhante desta estrada de retorno tem os passos firmes, o coração brando e a mente calma, nesse estágio preferimos os diálogos amorosos, não gostamos de confusão e nos abstemos de discussão.
Portanto há amor, há compressão, certo? As vezes não! Compreender sem querer em nome do amor pode causar confusão, gerar discussões e agressões que se eternizam em palavras malditas e depois viram feridas que queimam e ardem mais dentro do que fora.
Se há amor, lá haverá de ter também muita audição, ombro, acolhimento e amizade e respeito, por isso nem sempre haverá concordância.
Relembre sempre que aquilo que nos enrijece e nos entristece, também possui a capacidade de nos roubar e sem você não haverá amor.
Que o pranava Ommm esteja presente nos seus dias!
Gratidão.
Dan
P.S: Este é o meu artigo do mês de dezembro na revista Meer, confira lá…
https://www.meer.com/pt/75298-o-amor-proprio-como-chave-da-impermanencia