” … O vulgo pode fazer breves excursões às alturas, mas são as
planícies que ele habita. Eis o porque as associações de ideias vão contra tudo aquilo que é elevado.
Desde a infância ouvimos representarem certas coisas como bens, e outras como males. Aqueles que falaram conosco imprimiram em nós a ideia de seus movimentos, e nos acostumamos a vê-las da mesma maneira que eles, e a ligá-las aos mesmos movimentos e às mesmas paixões; [ .. . ] não as julgamos mais por seu verdadeiro valor, mas pelo valor que têm na opinião dos homens.
Ainda uma vez, é na reflexão atenta que o estudante encontrará o remédio para isso e conseguirá ver por si mesmo. Que ele mergulhe na vida, como todos os outros, isto é bem necessário: sem isso, não teria nenhuma experiência e poderia não saber evitar perigo algum.
Mas que, depois da experiência adquirida na vida comum, volte para si mesmo e analise cuidadosamente suas impressões; deixará então de enganar-se quanto ao valor, à grandeza, e sobretudo à relação das coisas consigo mesmo; descartará o que é de importação estrangeira.
Logo extrairá da vida de estudante ordinário a conclusão que a resume:
Ela é geralmente o sacrifício de todos os prazeres duráveis, das alegrias altas e serenas, à vaidade.
Vaidade de parecer livre, de encher os bares de gritos e algazarras, de beber como um ébrio, de voltar para casa às duas horas da manhã por fanfarrice, de mostrar-se por aí na companhia de mulheres que amanhã verá nos braços de sucessores não menos orgulhosos de se exibirem.
Depois da coerção do internato, depois da vigilância tão inquieta de seus pais, é claro que há nessa conduta uma manifestação aparatosa de independência. Mas para quê essa ostentação?
O sentimento real de sua independência, eis a grande alegria. O resto não passa de vaidade. Há uma falsíssima apreciação da extrema felicidade dessa vida faustosa.
E quanto à vaidade, é muito fácil satisfazê-la de uma forma inteligente! Como a alegria de ser apreciado pelos professores, de fazer excelentes exames, de satisfazer os desejos dos pais e de ser considerado um grande homem em sua cidadezinha é muito superior a essa satisfação vaidosa do estudante com o prazer, satisfação que está ao alcance do mais tolo dos porteiros, ou do balconista que acabou de receber seu salário!
Que o estudante entre, portanto, em si mesmo, e empreenda
uma crítica penetrante de todos esses prazeres que não são no
fundo senão fadigas e desgostos dissimulados por uma ilusão de vaidade.
Que disseque, além disso, um a um, todos os preconceitos
e sofismas que pululam contra o trabalho intelectual; que abra
muito bem os olhos e olhe cuidadosamente, em seus detalhes, alguns de seus dias e os princípios que o guiam.
Que essas reflexões sejam enriquecidas por leituras bem escolhidas, e ele deixe de lado tudo o que não seja de auxílio à sua vontade.
Descobrirá assim um novo mundo. Não estará mais condenado a contemplar, como os prisioneiros acorrentados na caverna de Platão, as sombras das coisas: verá então face a face a pura luz da verdade…”
Jules Payot
Este é um trecho do livro A educação da Vontade do maravilhoso Jules.
Achei surpreendente como a sociedade atual ainda caminha como se caminhava em 1830. Grau zero de desenvolvimento em muitos quesitos! Apreciem a partilha e se puderem leiam o livro, eu recomendo vivamente.
Por ora permitamos que o Sol brilhe ardentemente no nosso interior durante todo o inverno.
Gratidão,
Dan Dronacharya.
Quando eu não puder falar, escreverei…